Coisas que Acreditamos - Desordem Pública

Hoje, na mídia brasileira, não se fala mais de uma coisa senão o julgamento de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, acusados de terem jogado Isabella Nardoni, de cinco anos de idade, da janela do sexto andar de um prédio em São Paulo. O julgamento ocorre após quase dois anos completos do evento trágico que tirou a vida da inocente criança.

Você deve se lembrar. De maneira imediata,  a notícia da tragédia se espalhou por vários canais de TV. O ato covarde e incomum da morte da garota realmente chamava a atenção. Dia após dia, noticiários e programas de variedades tiveram assunto de sobra para preencher suas pautas e conseguir cobiçados pontos de audiência: eram inúmeras entrevistas com especialistas, simulações com bonecos, especulações sobre possíveis assassinos, possíveis situações de crime, uso da imagem e das lágrimas de Ana Carolina de Oliveira (mãe de Isabella), e de inúmeras fotos e filmagens da pequena criança. Por quê?

A Mídia escolhe. Tudo.

O crime envolvendo os Nardoni é emblemático. Envolve uma família de classe média alta, de “boa origem”, suposta boa formação, uma vida tranquila enfurnada em apartamentos, shopping centers e lojas de conveniência. Uma família de novela. Com problemas de novela. De novela.

Entretanto, algo aconteceu que bagunçou esta almejada e confortável ordem natural das coisas. A família foi vítima? A família foi vitimizante? Como assim?

A família de classe média, objetivo maior e inconsciente de todos os brasileiros, foi abalada. Assim como em uma novela, onde todos se sentem parte da família rica que toma suco de laranja com torradas besuntadas com geléia de marca todas as manhãs, os brasileiros acordaram como parte integrante da história, da dor.  A ponto de, no dia em que a menina faria aniversário, cantarem parabéns com bolo e tudo em frente à delegacia onde pai e madrasta prestavam depoimento.  Mais estranho que isso, só o fato de que ninguém percebe qual o seu próprio lugar nessa história toda.

Aliás, que história mais curiosa essa de pai e madrasta, não? Tão presente nos contos de fada! Que belo ingrediente midiático!

Quem faz parte da Mídia? Quem faz a Mídia?

A tragédia com a pequena Isabella repercute em toda a Mídia porque  mostra que crimes monstruosos como este também podem ocorrer com eles, e não apenas com a gentalha que mora nas periferias. Isso assusta, causa espanto, vira capa da Veja. Quantos assassinatos em periferias viram capa da Veja? Talvez  se for uma chacina… Aí sim. Mas tem que ser uma chacina bem feita, que envolva muita gente. Não… só isso não basta. Tem que ter alguém “grande” envolvida, porque morte por morte… são todos bestiais, não? Que tal se tiver alguém da polícia envolvido? Ou então, alguém de alguma dessas grandes organizações criminosas, como o PCC, afinal de contas, elas também assustam os leitores das revistas semanais brasileiras. Aí estaria estampada a estupidez das camadas mais pobres, e a ineficácia das políticas públicas de segurança, uma oportunidade gigante para a Mídia criticar os políticos que não quer eleger.

Existem os crimes que passam no Jornal Nacional. E os que passam no Cidade Alerta.

Por que este julgamento está sendo considerado um dos mais importantes da história do país? Porque a Mídia assim o fez. Foi, sem dúvida, fruto de um ato cruel, que vitimou um ser inocente. Mas não muito diferente do que costumeiramente acontece nos confins deste país. Crianças de classe média, quando mortas, viram anjos. Só elas.

Mas o cidadão comum, literalmente e lamentavelmente comum, acredita em certas coisas. Acredita na Mídia. Esta, sem sombra de dúvidas, não acredita nem um pouco nele.

Isabella não encontrou a paz que outras crianças vítimas de violência encontraram. Ela é a mártir de um país que se importa com uma parte bem seletiva de seus problemas. Bem seletiva. Bem Seletiva.

isabella-nardoni

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