Uma Boa Leitura  

Talvez, por Pablo Neruda

por Pablo Neruda

Talvez não ser,
é ser sem que tu sejas,
sem que vás cortando
o meio dia com uma
flor azul,
sem que caminhes mais tarde
pela névoa e pelos tijolos,
sem essa luz que levas na mão
que, talvez, outros não verão dourada,
que talvez ninguém
soube que crescia
como a origem vermelha da rosa,
sem que sejas, enfim,
sem que viesses brusca, incitante
conhecer a minha vida,
rajada de roseira,
trigo do vento,

E desde então, sou porque tu és
E desde então és
sou e somos…
E por amor
Serei… Serás…Seremos…

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Fragmentos disso que chamamos de “minha vida”

por Caio Fernando Abreu

Há alguns anos. Deus — ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro.

Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de “minha vida”. Outros fragmentos, daquela “outra vida”. De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.

Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.

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Steve Jobs e a Morte

por Steve Jobs

Texto extraído de seu Discurso para Formandos de Stanford

Minha terceira história é sobre a morte. Quando eu tinha 17 anos, eu li uma citação que dizia algo como: “Se você viver todos os dias como se fosse o último, ocasionalmente acertará”. Isso me deixou marcado e desde então, pelos próximos 33 anos, eu olhei no espelho todas as manhãs e me perguntei: “Se hoje fosse o último dia da minha vida eu iria querer fazer o que estou prestes a fazer hoje? E sempre que a resposta foi “não”, por muitos dias consecutivos eu sabia que precisava mudar algo. Lembrar que se vai morrer em breve é a mais importante ferramente que já encontrei para fazer grandes escolhas na vida. Porque praticamente tudo, todas as expectativas, todo o orgulho, todo medo de falhar, todas essas coisas simplesmente desaparecem, quando se enfrenta a morte. Deixando apenas o que é realmente importante. Lembrar que você vai morrer, é a melhor maneira que conheço de evitar a armadilha de imaginar que se tem algo a perder. Você já está nu, não há razão para não seguir seu coração.

Cerca de um ano atrás, fui diagnosticado com câncer. Fiz um exame 7:30 da manhã, que claramente mostrava um tumor no meu pâncreas. Eu nem sabia o que era um pâncreas, os médicos me disseram que esse era muito provavelmente um tipo de câncer que é incurável. E que eu não deveria esperar viver mais que 3 a 6 meses. Meu médico me disse para ir para casa e colocar meus assuntos em ordem. O que é o código dos médicos para “prepare-se para morrer”. Isso significa tentar dizer para seus filhos, tudo que você imaginou ter dez anos para dizer, em poucos meses. Isso significa ter certeza de que tudo está acertado, para que seja o mais fácil possível para sua família. Significa dizer adeus.

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Alento, por Caio Fernando Abreu

 

Quando nada mais houver,
eu me erguerei cantando,
saudando a vida
com meu corpo de cavalo jovem.
E numa louca corrida
entregarei meu ser ao ser do Tempo
e a minha voz à doce voz do vento.
Despojado do que já não há
solto no vazio do que ainda não veio,
minha boca cantará
cantos de alívio pelo que se foi,
cantos de espera pelo que há de vir.